REFLEXÕES....

A Crença, o Medo e  as Nossas Vidas

O que fundamenta a nossa crença em alguma coisa? É sempre esta pergunta que deveríamos fazer quando nos deparamos com algo que está arraigado no mais profundo das nossas almas, sem nos darmos conta que aquilo entrou de algum modo ali, vindo de fora, como uma abdução da qual não nos lembramos de nada. Se conseguirmos chegar à raiz das nossas crenças nas coisas provocamos aquilo que podemos chamar de esvaziamento da alma. E com ela vem o medo, o medo do nada, poderíamos dizer, a vertigem absoluta.

Um dia, há muito tempo, acreditei num ser supremo, a me julgar de lá do alto, a contar os meus débitos e créditos. Sentia muito medo desse senhor de barbas brancas sentado em seu trono celestial. Hoje não acredito mais. Não foi fácil superar a sensação de que o chão abaixo dos meus pés havia sumido. De repente me vi face a face com o abismo interminável e me deixei ser tragado por ele. Não seria essa a verdadeira experiência religiosa? O sentimento do infinito a nos golpear com seu sopro alucinante?

É possível acreditar que exista um ser superior beneficiando uns e prejudicando outros a partir da contabilização que faz do grau de devoção que dedicamos a ele? Vamos supor que torcedores de dois times que vão jogar entre si façam orações pedindo a Deus que o seu time seja o vitorioso. Deus beneficiaria quem nesse caso? Por quê? Isso demonstra o ridículo dessa ideia. Será que Deus possui um instrumento que mede a fé de cada um para saber qual deveria ser o time vencedor? Isto é, os mais fiéis seriam os vencedores? No meu ponto de vista, pensar a religião  desse modo, onde fazemos trocas com um ser superior ao qual devemos respeitar acima de tudo, é algo, no mínimo, infantil. É a vontade eterna de ser o filhinho do papai, é o medo da autonomia, é o medo de pensar por conta própria, afinal, é mais fácil ter alguém que ordene, “faça isso”ou “faça aquilo”.

Todos acreditam em alguma coisa, eu também. Acredito que Deus não existe. Não sou contra a religiosidade, também tenho a minha e, no meu modo de entender, não é necessário uma presença sobrenatural e inteligente para dar conta da vida e de tudo mais. Existe um mistério, e acredito que ele nunca deixará de existir, mas isso não autoriza imediatamente uma divindade ordenadora de tudo o que existe.

O meu corpo é o meu templo, o autoconhecimento é a minha oração, é o ritual que me leva ao mistério onde encontro o outro em mim mesmo, é onde me acabo e salto aos confins do universo no caos borbulhante da origem e do indecifrável colapso. Se me disserem que Deus nada mais é do que isso mesmo, então posso dizer que acredito em Deus.

Aceitar Deus sem qualquer reflexão, simplesmente pelo costume ou porque se todo mundo aceita também devo aceitar, como se fosse mais um produto a ser consumido é o caminho mais curto para o ódio e a intolerância, pois o fanatismo é o estado de submissão mais lastimável que existe, um ser pensante que não pensa vai contra a sua própria natureza e introduz o mundo no reino da ignorância, do medo e da barbárie completa.  

 Marco Maluf (14/03/2010)

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